Pseudo-intelectuais

Ser intelectual é se auto-instituir como tal, isto é, dar-se uma missão, uma missão de cultura, uma missão contra o erro (do passado e do presente,), uma missão de consciência pela humanidade.
(Meus Demônios, 1997 Edgar Morin)


É fácil ter opinião, difícil é ter argumentos para defendê-la. É muito fácil ser um pseudo-intelectual.O lance é saber como agir, e agir.

O primeiro passo é ler ao menos as manchetes do jornal. E assistir ao Jornal Nacional e ao Fantástico. Tudo passa por lá. Também é bom dar uma olhada na Veja e, lógico, falar que é a pior revista do Brasil,
apesar de não saber o motivo. Agora que você já sabe o que se passa pelo mundo, vamos ao segundo passo.

O segundo passo é comprar livros. Muitos livros. E colocá-los em um lugar a vista dos visitantes. Mas não pode ser juvenil. Tem que ter um pouco de bom senso. Compre livros grandes, daqueles de no mínimo 700 páginas, de capa dura, para ocupar mais espaço na sua biblioteca particular. Quando já estiver com essa “bíblia” de três polegadas em mãos a deixa à mostra. As pessoas adoram ver livros, já ler é outra coisa. Ah! E por favor, saiba ao menos o conteúdo do livro. E faça alguma
crítica sobre ele, do tipo “achei o autor muito prolixo.” Acredite, vai ter gente que nem saberá o que significa prolixo e quem souber preferirá não perguntar.

Depois é preciso conhecer alguns temas e autores, pro caso de ir alguém que entenda do assunto na sua casa. Para ser intelectual, portanto, não deve se cometer a gafe de expor livros do Paulo Coelho, por exemplo. Nem comente sobre o Pedro Bial. Uma coisa sempre boa para ter em mãos é Freud, ele explica tudo! O negócio é ter alguns daqueles livros intelectual mesmo, sabe!? Aqueles de história, filosofia e sociologia. Ora, sociologia é muito cult, tem que ter. Para isso completa-se com os autores. Weber é básico. Não vale Platão, já é muito batido. Opte sempre por algo não muito conhecido (em qualquer aspecto, afinal você é um intelectual, não se impressiona com o trivial), assim dará a entender que você entende do assunto e busca fontes alternativas.

Quando já estiver com esses detalhes todos organizados, fique tranqüilo. Você já será quase um intelectual. E o melhor, sem precisar ler uma linha. Mas para seguir no rumo em busca da opinião pública e estrelato, uma coisa é fundamental. Jantares! Muitos jantares, com convidados do mesmo naipe que você, buscando ser cult. Tudo regado a muito vinho (vinho também é um ótimo tema de conversas, intelectual tem que entender) e a temas filosóficos, buscando explicações sociológicas para o coito dos coelhos da Malásia. Não tem erro essa, ninguém sabe nada dos coelhos malásios.

Música também é muito importante. Intelectual tem que gostar de música. Não é música clássica. Isso agora é brega! O segredo mesmo é Jazz, Blues e Bossa Nova. Como já disse anteriormente, nada de artistas consagrados, procure sempre aqueles não muito conhecidos: uns caras do sul da Inglaterra ou um Ianque desconhecido, do leste da Califórnia. Super funciona. Essa mistura, seguida de um óculos de grau, com aro grosso e escuro é certeira. Não há mais necessidade daquelas roupas bregas, isso é coisa de filme. Você pode ser despojado, com um toque clássico de elegância. Abuse das cores sujas: beje, nude, rosa, verde musgo, caqui, marrom...e preto, claro!

Já ia me esquecendo das artes. É essencial ter umas esculturas ou obras plásticas de artistas desconhecidos da América Latina.

Agora você já pode criticar tudo e todos, ser do contra e fazer cara blasé. Mas falando sempre com muita convicção, sem atacar nenhum dos lados – vai que tem alguém afim de argumentar. Lembre-se sempre de falar sobre livros em suas conversas, filmes antigos também são um acerto. Depois que tudo isso estiver pronto, basta agora lançar um livro, se candidatar a deputado, e ajudar uma ONG.

Por Juliana Freitas

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